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GUERRAS ULTRAMARINAS - Opiniões
A questão das guerras ultramarinas tem merecido uma avalanche de opiniões e comentários cujos autores mais parecem mixordeiros a atirar lama para cima das muitas centenas de milhares de combatentes que cumpriram, o melhor que puderam e souberam, os seus deveres patrióticos. Alguns dos comentadores e contadores de estórias chegam a resvalar para o ridículo das narrativas abstractas conjecturando cenários jamais imaginados. O que lemos e ouvimos são incongruências desfasadas da realidade que muitos viveram naquele tempo. Custa-me acreditar que os homens, com graves responsabilidades nas acções brutais de repressão e chacina aquando dos acontecimentos da revolta na Baixa do Cassange, tenham a veleidade de vir para a praça pública tentar justificar os excessos cometidos pelos seus comandados. Seria mais razoável que essa gente se recolhesse no silêncio, resguardando no esquecimento os seus actos selvagens.
Ao longo dos tempos, muitos dos intervenientes nas primeiras operações de guerra (caçadores especiais, polícias, pára-quedistas, especialistas da Força Aérea) que comigo conviveram ou convivem, manifestam cautela e incomodam-se quando vem à tona alguma referência a esse período negro do tempo das operações militares em Angola.
Os crimes cometidos contra as populações trabalhadoras, que as autoridades desprezaram em favor dos exploradores da Cotonang (empresa de capitais maioritariamente belgas), são monstruosos e irreparáveis. A administração portuguesa determinou o aniquilamento de muitos milhares de agricultores que a Cotonang escravizava. Para isso, usou as armas da polícia e dos militares mal preparados para acções de policiamento, enquanto a Força Aérea bombardeou e arrasou aldeias inteiras. Os mais conscientes tentaram conter a brutalidade das acções repressivas, mas cedo perceberam a sua incapacidade para suster a máquina destrutiva.
Na tentativa de silenciar aqueles que pudessem testemunhar para o mundo tamanha chacina, as autoridades nomearam “grupos especiais” para fazer buscas de casa em casa e “caçar” os presumíveis “cabecilhas” dos revoltosos. Numa dessas vergonhosas missões de “assassinatos” selectivos, o próprio comandante do grupo recusou estar presente no acto de fuzilamento sumário. Ainda hoje, alguns dos intervenientes numa acção de fuzilamento, levada a cabo na Gabela, não entendem como foi possível a tropa portuguesa, que se presume civilizada, chegar ao ponto de praticar actos de tamanha crueldade.
Depois, veja-se o que fizeram as autoridades policiais e militares, bem como os colonos brancos nos muceques de Luanda, a partir do dia dos funerais dos sete polícias vítimas dos assaltos na noite de 4 de Fevereiro de 1961 – foi uma autêntica caça ao “bandido” com muitos milhares de sevícias e assassinatos. Os ódios foram atiçados e a resposta selvagem não tardou. Dizer que o Salazar estava avisado da preparação das atrocidades contra os brancos e negros bailundos era pura fantasia. O que se passou teve tamanha dimensão e foi tão macabro que ninguém imaginou tal hecatombe. Não venham, agora, os adivinhas do costume tentar justificar o que quer que seja. Meus caros, não há desculpas para tanta crueldade e chacinas a sangue frio, como aconteceu na Baixa do Cassange, nos últimos meses de 1960, nos muceques de Luanda, em Fevereiro e no norte de Angola, a partir da noite de 15 de Março de 1961.
Dos exemplos de incongruências, temos os actos de “bravura” do alferes Fernando Robles, da 6ª companhia de Caçadores Especiais, que não são mais do que desmandos por lhe ter sido dada liberdade para matar indiscriminadamente as populações indígenas. A loucura foi tal que o levou a descorar as regras elementares de precaução e deixou que o inimigo causasse dezenas de baixas entre os seus homens, quando progredia em zona infestada de bakongos instrumentalizados para estripar e esquartejar seres humanos. Provavelmente, a sua experiência na Baixa do Cassange, contra populações desarmadas, o tenha deslumbrado ao ponto de tamanha leviandade. A crueldade não justificou as chacinas nem os ódios que se tornaram intoleráveis. As consequências foram dramáticas, mas ninguém poderia saber o que esperava as populações das roças do café e das povoações das terras do norte de Angola. A ideia de que Salazar poderia saber dos planos para o massacre de 15 de Março de 1961 só pode ser falaciosa e mostra quanto de ignorância anda na cabeça de muitos escribas que pretendem deformar a história.
Tenhamos respeito pelos mortos e estropiados, bem como pelos desenraizados que o ambiente de guerra mutilou no corpo e na alma. O sofrimento e as angústias dos soldados e dos familiares deve merecer a mais alta estima da nação. Deixemos que a história faça o seu percurso serenamente e acreditemos que ainda há escribas honestos e livres para fazer o seu trabalho com competência.
Joaquim Coelho – combatente, em Angola por convicção, e em Moçambique, por imposição.
Capitão Mendonça da 6ª CCaçEspeciais
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7 comentários:
Que falta de rigor. P. ex.: o Alferes Robles não esteve na Baixa do Cassange. À data desses acontecimentos estava em Lisboa, com o seu batalhão, a preparar-se para embarcar para a Índia. Semanas depois, acabou por embarcar para Angola. Que o autor seja leviano e boçal na análise que faz dos factos, ainda vá. Escusa é de ser mentiroso. Já agora, as fotografias de negros massacrados que publica, tal como bem sabe, são negros bailundos mortos pelos bacongos da UPA e não pelos protugueses.
http://apvg.pt/mul.php
Por aqui se pode ver que a Companhia do Alferes Robles, em 2 anos de comissão em Angola, teve SEIS baixas. SEIS, seu Coelho mentiroso. E tem o desplante de afirmar que a 6ª CCE teve DEZENAS de mortos? Mas tão mau como o autor deste artigo é quem publica a porcaria que ele escreve: é conivente com a mentira.
Para o inigmático sem nome "PFGFR": Para quem se mostra tão pronto a insultar e querer ser dono da verdade, desconhece o percurso das Companhias de Caçadores Especiais e os relatórios das missões e operações miliutares de que relemos para não haver dúvidas. Além de combatente operacional, fiz reportagem com 4 das ditas companhias de Caçadores Especiais, onde havia seis conterrâneos que me relataram algumas das mais incríveis façanhas do Robles. Claro que pode havir alguma imprecisão no que me foi relatado, mas o essencial está testemunhado e comprovado. Gente sem escrúplos a tentar impingir "filmes" em tempo de guerra existe, mas deve haver alguma contensão.
E desde quando "Jota Coelho" é um nome real? Assino com as minhas iniciais, tal como o senhor assina com "Jota". Entretanto, no primeiro número da nova revista da Comissão Portuguesa de História Militar, já escrevi um artigo onde exponho e rebato as suas mentiras. O artigo versa esta temática, verá que o autor se chama Paulo Rodrigues, e que as iniciais desta assinatura correspondem ao nome do autor. De resto, não sou só eu a chocar-me com as mentiras que o senhor Jota Coelho publica: por exemplo, o antigo alferes miliciano Serafim Sousa e Silva também já expôs, no Facebook e noutras redes sociais, essaas mesmas mentiras do Sr. Jota Coelho (sob o título "As mentiras do sargento"). O Alferes Sousa e Silva esteve exactamente na zona onde o Alferes Robles andou, ao mesmo tempo que ele. Mas não lhe dá jeito a si, sr. Jota Coelho, admitir que errou, pois não? O orgulho e a vaidade primeiro, a verdade só depois. E também eu conheço Caçadores Especiais, com quem falei. E estiveram nos Dembos. E TODOS negam as mentiras do Sr. Jota Coelho que eu acima expus.
Mas vamos por partes: pode confiar-se no rigor de alguém que escreve "inigmático" em vez de "enigmático", entre outros erros de português? Duvido.
1) Onde estão as provas de que a 6ª Companhia de Caçadores Especiais, do Alferes Robles, esteve na Baixa do Cassange? Não existem, porque não esteve, e a documentação oficial (disponível em locais como o AHM e o AGE) com o seu histórico operacional, mostra que não esteve. Chegou a Angola DEPOIS. Por isso, se as suas fontes (sejam operacionais ou não) lhe mentiram, isso não isenta o senhor Jota de confirmar a verdade através de documentos oficiais que são públicos, antes de escrever barbaridades. Essa do "quem lá esteve é que sabe" não vale mais do que documentos oficiais da época, e o histórico operacional da dita companhia, aliado a outros testemunhos de outros que também lá estiveram, falam por si. 2) O número de baixas da 6ª CCE é público, está até disponível online, no site da Liga dos Combatentes, decerto mais fiável do que o senhor Jota e os seus amigos "que lá estiveram". Veja, por favor, e tenha um pingo de humildade para corrigir as suas mentiras. 3)É também público e elementar que o saudoso Coronel (então capitão) Rui Vasques de Mendonça comandou a 5ª CCE, ao contrário do que o senhor afirma. A 6ª era comandada pelo então capitão Raul Leandro dos Santos. É fácil de confirmar, se quiser ter um pingo de rigor. E não sou dono da verdade. Apenas me ENOJA e REVOLTA PROFUNDAMENTE que se minta e se falsifique a História. Não são "imprecisões", são mentiras e acusações graves. Por último, as comissões do senhor Jota não o tornam especialista em História da Guerra do Ultramar. Se só quem "lá esteve" é que pode falar (neste caso, mentir, conforme eu e o Alferes Sousa e Silva já provámos) então ninguém poderia falar sobre o Império Romano, pois quem o viveu já morreu. A História é feita por historiadores, com base nos DOCUMENTOS OFICIAIS DA ÉPOCA e em testemunhos. Não é só numa coisa nem só na outra, sobretudo quando os testemunhos se contradizem. Ouvir 3 ou 4 pessoas (eventualmente, mal intencionadas) e não confirmar o que elas afirmam (verificando documentos oficiais que são públicos) não é fazer História. Pior ainda é quando, depois de ser alertado para os erros, se persiste neles por mera teimosia e, possivelmente, excesso de vaidade.
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