segunda-feira, 11 de julho de 2022

Memórias do Ultramar

                                    LEMBRAR PARA NÃO ESQUECER

 

Aos que vão resistindo ao desgaste da vida e às investidas dos fazedores de crises que nos atormentam e hipotecam o futuro dos nossos filhos e netos e desgastam a nossa dignidade, venho lembrar que há 50 anos, em terras de Angola, os Pára-quedistas voluntariosos e valentes, organizados em pequenos grupos de combate, souberam elevar bem alto o nome e o valor dos Boinas Verdes.

Continua na memória dos sobreviventes que hoje conseguem contar a história dos graves acontecimentos e dos horrores praticados por sucessivas vagas de bandoleiros sanguinários que chacinaram, esventraram e mutilaram crianças, mulheres, velhos e novos, pretos e brancos no norte de Angola. Desde o Úcua ao Quitexe, passando por Nova Caipenda, Quibaxe, Nambuangongo, Cuimba, Madimba, Buela, Zalala, Damba, Quibocolo, Bungo, Mucaba e tantos outros lugares da região dos Dembos, onde os sinais do sangue derramado por inocentes indefesos atiçou o sentido patriótico e fortaleceu o espírito de sacrifício na luta contra as hordas assassinas. Com reduzidos recursos e muita vontade de vencer, os Pára-quedistas estiveram na linha da frente na defesa das populações mais atingidas pela selvajaria dos bandoleiros da UPA (União das Populações de Angola). Foi na missão de socorro aos defensores de Mucaba, entrincheirados dentro da igreja local; no Bungo, as capacidades de liderança do Alferes Pára-quedista Mota da Costa permitiram uma defesa eficaz; na Damba, onde um pequeno grupo de Boinas Verdes conseguiu suster os ataques; na povoação 31 de Janeiro, o Tenente Pára-quedista Veríssimo teve papel destacado na organização da defesa da população local, onde contou com a fidelidade e apoio do cabo de cipaios Sebastião, do chefe de posto Vailão e do soba Camassa.

Foi no decorrer destas difíceis intervenções dos Pára-quedistas que tombaram os primeiros Boinas Verdes: o soldado Pára-quedista Domingos, durante a caminhada para Mucaba; o Alferes Pára-quedista Mota da Costa e o civil Caras Lindas, quando procuravam manter a ligação entre os que reparavam a ponte do Bungo e o soldado Pára-quedista Eugénio Dias, o civil António e dois bailundos que se dirigiram a uma fábrica de café e serração próxima na procura de material para a ponte.

Para suprir a falta do Alferes Mota da Costa, o sargento Pára-quedista Joaquim Santiago assumiu a responsabilidade de coordenação das acções necessárias para evacuar os mortos e os feridos até à base do Negage. Helicópteros para evacuação não havia, apenas algumas viaturas civis e pequenos Unimogues eram os recursos disponíveis para percorrer picadas esburacadas e cortadas por árvores de grande porte.

Com audácia e tenacidade na defesa das gentes dessas terras martirizadas pela sanha assassina dos bandoleiros os Pára-quedistas demonstraram todo o seu saber e espírito de sacrifício no cumprimento do dever “honrando a Pátria de tal gente”. Os elogios e provas de gratidão vieram de todos os lados, os jornalistas tentavam colher mais informações dos acontecimentos. Depois das primeiras missões de reconquista e ocupação das localidades vandalizadas, os Caçadores Especiais e outras tropas que foram chegando a Luanda começaram a ocupação definitiva da região atribulada. As Tropas Pára-quedistas, já reforçadas com mais efectivos, entraram em acção nas grandes operações levadas a cabo nos saltos em Quipedro, na serra da Canda e em Sacandica (localidade fronteiriça com o ex-Congo Belga, no extremo norte de Angola), com intervenção a nível de companhia. Com o Batalhão e a Força Aérea bem organizados, em colaboração com as tropas de quadrícula instaladas nas zonas afectadas pela guerrilha, as missões dos Pára-quedistas passaram a ser rotineiras e normais. 

 

 

Para situar no tempo o sentimento dos que viveram os primeiros embates, não posso deixar de transcrever alguns recortes dos jornais de Luanda, onde são relatados episódios com intervenção de Pára-quedistas:

 

 - Da entrevista do Soldado Eugénio Dias, que foi ferido durante o ataque dos bandoleiros quando se encontrava na tal fábrica do café do Bungo, ao jornalista Moutinho Pereira do jornal “O Comércio”, publicada em 12 de Maio de 1961: “O ataque foi na segunda-feira, dia 8. Uma coluna de militares e civis, todos armados, seguiu até à ponte que os bandidos tinham cortado, para a reparar. Ao chegar à ponte o nosso comandante disse-me para ficar com os civis e protegê-los em caso de ataque, enquanto eles seguiam. Fiquei sozinho, pois sabia que os meus camaradas não podiam ir a pé… os carros não podiam atravessar a ponte… Ao sair da fábrica do café, já distanciados, ouvimos um tiro entre o capim. Claro que ficámos atentos e vigilantes. Mas aquela arma que disparou, por certo devido a algum acidente, dera o alarme. Logo se seguiu um tiroteio intenso. Encontrámos centenas de bandoleiros meio encobertos pelo capim. Os dois bailundos ainda não tinham feito a tropa e estavam desarmados, conseguiram fugir e refugiar-se na fábrica… Dei por mim a disparar a minha metralhadora ligeira para o meio do capim. A meu lado, o civil, ajudava-me como podia… Já ferido nas pernas, tentámos tomar outra posição…  À nossa roda tínhamos uma multidão ulutante, disposta a tudo para nos cortar a cabeça. Gritavam como demónios… Saltámos para o meio do capim alto, costas com costas, esperando o pior… por ali fiquei até perder as forças. Então, os meus camaradas conseguiram passar. Logo que se desenvencilharam daquela corja vieram à nossa procura…. Encontraram-nos feridos mas ainda conscientes no meio do capim, apertando de encontro ao peito, as nossas armas.”

 

- O jornalista Sotto Mayor do “Diário de Luanda” na edição de 17 de Maio de 1961 publicou alguns depoimentos sobre a situação no posto de 31 de Janeiro.

O repórter acompanhou uma das missões aéreas das avionetas do Aero Clube de Sanza Pombo e o chefe de posto e piloto Barros: “Aterrámos, cerca das 13 horas, no pequeno campo de aviação, onde se fizeram descargas de mantimentos e fomos convidados do chefe de posto Vailão e pelo tenente pára-quedista Veríssimo, dois valentes, à volta dos quais, pela sua actuação têm sido publicadas as mais largas reportagens. A defesa da povoação está toda concentrada à volta do edifício do posto, onde a população se recolheu. Pelas portas e janelas notam os sinais das lutas que têm sido travadas, estando as varandas do prédio barricadas com sacos de areia e arame farpado. Durante a refeição, servida numa grande mesa onde tomaram lugar grande parte dos “páras” e comerciantes da região, tivemos ocasião de ouvir do próprio chefe de posto, uma curiosa narrativa pormenorizada dos acontecimentos registados. – “Nós, em dada altura, verificámos que não tínhamos condições de defesa. Evacuámos, portanto, imediatamente a povoação. Toda a população foi connosco. Seguimos para a Damba, sede de concelho. Foi no dia 16 de Abril de 1961. Após a nossa chegada, deu-se o primeiro ataque à localidade. Colaborámos na defesa da Damba, neste e em mais três assaltos. Mas o nosso interesse era regressar o mais depressa possível ao 31 de Janeiro. No dia 27 conseguimos uma secção de Pára-quedistas, comandada pelo Tenente Veríssimo, para o nosso posto… Tivemos que lutar com muitas dificuldades. Eram obstáculos de toda a ordem – cortes profundos na estrada, árvores caídas, pontes danificadas. Era um nunca mais acabar.” O tenente Veríssimo relembra alguns acontecimentos passados na viagem: “Encontrámos ligeiras resistências durante o percurso de cerca de 84 quilómetros. No desvio para a povoação de Mucaba, a 12 quilómetros do destino, recuperámos diversos rapazes, portugueses africanos, que estavam prisioneiros dos bandoleiros no local conhecido por “Missão”. Temos tido diversos ataques, os primeiros de dia, os restantes de madrugada. Agora apenas têm tentado… mas depressa são repelidos e com baixas.”

Não havia tempo para pensar onde estava a razão; a necessidade de defender as populações indefesas e os postos isolados do norte de Angola era a prioridade, e a nossa fidelidade à Pátria impunha que cumpríssemos essas missões das quais saímos triunfantes, embora com grandes sacrifícios. Depois destas, muitas mais foram levadas a cabo com sucesso, as quais mereceram rasgados elogios e os mais altos louvores. Orgulhamo-nos dos nossos feitos e merecemos o reconhecimento da Nação. Apesar do ostracismo a que foram votados, os Combatentes portugueses, intervenientes nas guerras ultramarinas, são o que resta da gesta de valores que a Pátria contempla; dos cobardes não reza a história… muitos dos nossos governantes nunca souberam honrar a Pátria nem os juramentos e tentam desvirtuar os valores que “mais altos se levantam”.

 

 

- NAMBUANGONGO

Os pára-quedistas saltaram lá antes da chegada do Batalhão 114. Para a maioria dos oficiais da Força Aérea e Pára-quedistas foi um golpe baixo dos estrategas da Força Aérea, não respeitando o esforço dos Batalhões que estavam a pouca distância de atingirem aquele objectivo; embora com dificuldades em percorrerem o que restava dos difíceis caminhos...

 

In: “ESTILHAÇOS”, temas da guerra el Livro publicado em 2019 e 2ª Edição em 2020

sexta-feira, 11 de março de 2022

A Guerra vista ao Espelho

 Todas as guerras têm dois lados 

Em tempo de conflitos e guerra, as maiores vítimas são os inocentes. 

O jornalismo noticioso independente tem grandes dificuldades em sobreviver aos nefastos efeitos da informação controlada pelos poderosos. Somos inundados de informações repetitivas até à exaustão.  Sentimos a comunicação social amarrada à perversão do imediatismo lamacento e tendenciosamente programado para deformar a informação disponível e livre das pressões corporativas dominantes, arrumando para debaixo do tapete os graves problemas da sociedade, especialmente no aumento do custo de vida, na delinquência juvenil e a degradação dos serviços públicos essenciais.

 Mas ainda vemos alguns artigos que merecem ser lidos e vale a pena meditar com a lucidez da mente iluminada e racional. Os silêncios sobre estas questões agradam ao poder político e estigmatizam as populações desoladas com a falta de soluções para as suas dificuldades de sobrevivência.

Perante o conflito na Ucrânia e os problemas de mobilidade causados, os caminhos para a Paz são prioritários e urgentes, porque milhões de pessoas sofrem e morrem nos horrores da guerra; mas, perante o comportamento dos governantes interventivos no conflito ucraniano e o melindre da situação da segurança mundial, percebemos que as soluções perigosamente irracionais e com efeitos práticos e temporais inadequados demonstram desprezo e desamor pelas populações dos países que representam, considerando que o prolongamento da guerra só causa mais destruição e mortos.

Esperamos que uma onda de bom-senso e alteração dos interesses mesquinhos da desforra ilumine as mentes dos intervenientes com poder de decisão para que coloquem a vida das pessoas num patamar mais humanista e avancem corajosamente nos caminhos da paz e da segurança universal.

A hipocrisia das Sanções... VER:

 https://www.youtube.com/watch?v=dBIiz4HlXlI

https://www.youtube.com/watch?v=yXaxFxOXC6A

https://www.youtube.com/watch?v=yFmiWE2E3U4

https://www.youtube.com/watch?v=HMIsQ_6Abmo


 




Televisão do Mundo

20 de março às 16:41  · 

“A Ucrânia está seguindo os manuais de guerra psicológica dos EUA” (Pedro Baños)

Polêmica na TV espanhola. Coronel do exército denuncia manipulação midiática contra a Rússia: “Se falamos de desinformação, neste país há gente que trabalha para serviços de inteligência estrangeiros que estão publicando nos principais jornais e aparecendo nos meios de comunicação que são panfletos da OTAN”. Considerado um dos maiores especialistas em Geopolítica e estratégia militar da Europa, o coronel Pedro Baños afirmou que “o regime de Zelensky está seguindo os manuais de guerra psicológica dos EUA”, a quem não interessa um acordo que encerre o conflito. Presença frequente em alguns dos programas de maior audiência da TV espanhola, como “Horizonte” e “Al Rojo Vivo”, o coronel (que vem recebendo ameaças nas redes sociais por suas opiniões dissonantes) anunciou que não participará mais de nenhum programa de TV sobre a Ucrânia.

O humanismo ocidental é decente?

Pedro Tadeu – DN 09 Março 2022

 Por ser um bom cidadão do mundo ocidental condeno a invasão russa da Ucrânia, participo em manifestações contra Putin, choro os mortos de Kiev, comovo-me com o drama dos refugiados ucranianos, sou solidário com as vítimas da brutalidade russa e recuso comprar produtos russos. E faço-o com convicção.

Mas isto não chega, isto é humanismo genérico, serve para qualquer um em qualquer parte do mundo - o humanismo ocidental é especial, o humanismo ocidental é único, o humanismo ocidental é original, o humanismo ocidental exige mais de mim...

O humanismo ocidental é seletivo: ignorou os 12 mil haitianos enviados pelos Estados Unidos para a prisão de Guantánamo e a invasão do país em 1994; ignorou a instigação e a participação da NATO nas guerras da Jugoslávia e os seus 150 mil mortos; ignorou as duas Guerras do Golfo, a mentira que desculpou uma delas e os 100 mil mortos diretos que os combates provocaram; ignorou mais 100 mil mortos que o Iraque "protegido" pela coligação internacional lá instalada provocou; ignorou a presença norte-americana durante 20 anos no Afeganistão e os 65 mil mortes que ali ocorreram; ignorou os envolvimentos, desde 2001, diretos ou indiretos, de forças ocidentais na Síria (estimam-se 400 mil mortes); ignora o que se passa na Somália e no Iémen; ignora a ocupação da Palestina por Israel e, nos últimos anos, os 21 500 mortos desse conflito.

O humanismo ocidental tem coração mole para um lado e coração de pedra para o outro. As guerras espalhadas pelo mundo com envolvimento do Ocidente somam, em 30 anos, quase um milhão de mortos, a grande maioria civis, mas o bom cidadão ocidental não chora por eles.

O humanismo ocidental é dúbio. Condena vigorosamente a prisão do opositor de Putin, Alexei Navalny, mas deixa apodrecer na cadeia o denunciador das brutalidades das tropas americanas e da NATO, Julian Assange.

O humanismo ocidental é criterioso. Manifesta-se quando críticos de Putin são envenenados no estrangeiro mas arquiva no esquecimento o cientista inglês David Kelly que, misteriosamente, suicidou-se dois dias depois de depor no parlamento sobre a falsificação de provas da existência de armas de destruição maciça no Iraque. E o jornalista que deu essa notícia em primeira mão foi despedido.

O humanismo ocidental é esclarecido. Classifica a imprensa estatal russa de instrumento de propaganda "tóxica" mas glorifica o World Service da BBC, pago pelo Ministério dos Estrangeiros britânico e onde muitos jornalistas portugueses que lá trabalharam foram obrigados, durante décadas, a pedir autorização superior para fazer qualquer tipo de entrevista... e essa autorização só vinha depois de lida a lista de perguntinhas a fazer!

O humanismo ocidental é dinâmico. Indigna-se aos gritos com a censura de Putin ao jornalismo independente, mas refila baixinho quando proíbem a Russia Today de emitir no Ocidente ou quando os potentados das redes sociais, que ninguém controla, filtram o que o povo pode ou não pode dizer.

O humanismo ocidental enerva-se com a brutalidade policial contra manifestações políticas em países longínquos e contra as prisões indiscriminadas de gente comum, mas cala-se, conformado, quando isso é feito nos seus países contra os que recusam vacinar-se, contra os que exigem direitos para os negros, contra os sindicalistas, contra os imigrantes pobres e de pele escura. O humanismo ocidental já nem se lembra de George Floyd.

O humanismo ocidental é espertalhão. Explica todas as intervenções militares do Ocidente no resto do mundo com a necessidade de defender a democracia, o contexto histórico e sociológico das regiões, as tensões estruturais das economias locais, as rivalidades das religiões, as divisões tribais, as fronteiras mal definidas, a selvajaria dos ditadores locais. Mas para comentar a guerra ucraniana só aceita começar a análise por um facto: Putin invadiu no dia 24 de fevereiro o país de Zelensky. Falar do que está para trás, dos 13 mil mortos do Donbass, do crescimento da NATO para leste, por exemplo, é trair a Ucrânia, é trair o Ocidente, é trair a humanidade - e se o fazes, és mesmo má pessoa!

O humanismo ocidental é ingrato. Garante que a Rússia não é do Ocidente, exige que ignoremos 2 mil anos de cristandade partilhada, as leituras de Dostoiévski, Tolstoi, Tchekhov, Gorki; as músicas de Tchaikovsky, Stravinsky, Shostakovich, Prokofiev; os filmes de Eisenstein, Tarkovsky; os pensamentos de Bakunine, Lenine ou Trotsky. O humanismo ocidental acredita que nada deve do que é à Rússia.

Eu adoro os valores teóricos do humanismo ocidental, são um exemplo para o mundo, a sério, mas não aguento a constante prática violenta do humanismo ocidental, uma vergonha neste mundo, a sério.

Jornalista


Ora, por causa dos mercenários (combatentes sem pátria), dos voluntários sem comando e dos resistentes desesperados, a desconfiança sobrepõe-se ao bom senso... Dificilmente os corredores humanitários terão sucesso, e quem sofre são as populações.










quarta-feira, 2 de março de 2022

Os Incendiários do Costume

 NOTA PRÉVIA: A Ucrânia e a sua população estão a sofrer a tragédia da guerra, por causa dos incendiários americanos que não param de espalhar o terror e a morte em todo mundo. Expandir o potencial bélico da NATO até às portas de Moscovo é um perigoso jogo a que Putin e os Russos não pretendem assistir.

 Os interesses estratégicos USA ou pilhagem de matérias-primas (desde a América latina, países da África, médio oriente, Iraque, Afeganistão, Líbia, Síria e antigos países de leste), servem para vender as armas e provocar a desgraça dos povos. O texto abaixo mostra os antecedentes.

 Haja lucidez e vontade para acabar com as guerras e genocídios criminosos, proclamando a PAZ definitiva. 

  


Ucrânia, a bomba USA na Europa

Manlio Dinucci

REDE VOLTAIRE | ROMA (ITÁLIA) | 16 DE ABRIL DE 2021

O Presidente Joe Biden, o Secretário de Estado, Antony Blinken e a futura Subsecretária de Estado, Victoria Nuland, estão a reacender a guerra que desencadearam na Ucrânia em 2013-14. O quarto ladrão, Geoffrey R. Pyatt, é actualmente, o Embaixador dos EUA na Grécia. Desta vez estão a enviar navios de guerra para o Mar Negro e a preparar, de facto, aviões bombardeiros nucleares.


Os caças americanos F-16, enviados da base de Aviano, estão envolvidos em "operações aéreas complexas" na Grécia, onde ontem começou o exercício Iniochos 21. Pertencem ao 510º Esquadrão de Caças estacionado em Aviano, cuja atribuição está indicada no seu emblema: o símbolo do átomo, com três relâmpagos a atingir a terra, flanqueado pela águia imperial. São aviões de ataque nuclear e que pertencem à Força Aérea Americana na Grécia, que concedeu aos Estados Unidos, em 2020, a utilização de todas as suas bases militares. Também participam no Iniochos 21 os caças bombardeiros F-16 e F-15 de Israel e dos Emirados Árabes Unidos. O exercício ocorre no Mar Egeu, perto da área que compreende o Mar Negro e a Ucrânia, onde se concentra o mega exercício Defender-Europe 21, do exército dos EUA.

Estas e outras manobras militares, que fazem da Europa um importante centro de armamento, criam uma tensão crescente com a Rússia, centrada na Ucrânia. A NATO, depois de ter desagregado a Federação Jugoslava, ao inserir a cunha da guerra nas suas fracturas internas, surge agora como a paladina da integridade territorial da Ucrânia. O Presidente da Comissão Militar da NATO, o Chefe da Força Aérea Real Britânica, Stuart Perch, reunido em Kiev com o Presidente Zelensky e o Chefe do Estado-Maior, Khomchak, declarou que "os aliados da NATO estão unidos na condenação da anexação ilegal da Crimeia pela Rússia e das suas acções agressivas na Ucrânia Oriental". Repetiu assim a versão de que foi a Rússia que anexou à força a Crimeia, ignorando o facto de que foram os russos da Crimeia que decidiram, num referendo, separar-se da Ucrânia e voltar a juntar-se à Rússia para evitar serem atacados, como os russos no Donbass, por batalhões neonazis de Kiev. Os mesmos utilizados em 2014 como força de ataque no putsch da Praça Maidan, desencadeado por franco-atiradores georgianos que dispararam sobre manifestantes e polícias, e em acções posteriores: aldeias submetidas a ferro e fogo, activistas queimados vivos na Câmara do Trabalho de Odessa, civis desarmados que foram massacrados em Mariupol, bombardeados com fósforo branco em Donetsk e Lugansk. Um golpe de Estado sangrento sob comando USA/NATO, com o objectivo estratégico de provocar uma nova guerra fria na Europa para isolar a Rússia e reforçar, ao mesmo tempo, a influência e a presença militar dos Estados Unidos na Europa.

O conflito no Donbass, cujas populações se auto-organizaram nas Repúblicas de Donetsk e Lugansk com a criação das suas próprias milícias populares, passou por um período de relativo descanso com a abertura das conversações de Minsk para uma solução pacífica. Agora, porém, o governo ucraniano retirou-se das conversações, com o pretexto de que se recusa a ir a Minsk porque a Bielorrússia não é um país democrático. Ao mesmo tempo, as forças de Kiev retomaram os ataques armados ao Donbass. O Chefe do Estado-Maior, Khomchak, que Stuart Perch elogiou em nome da NATO pelo seu "empenho na procura de uma solução pacífica para o conflito", disse que o exército de Kiev "está a preparar-se para a ofensiva na Ucrânia Oriental" e que nessa operação "está planeada a participação de aliados da NATO".

Não surpreende que o conflito no Donbass se tenha reacendido quando, sob a administração Biden, Antony Blinken assumiu o cargo de Secretário de Estado. De ascendência ucraniana, foi o principal orientador do Putch da Praça Maidan, na qualidade de Vice-Conselheiro da Segurança Nacional na Administração Obama-Biden. Como Subsecretária de Estado, Biden nomeou Victoria Nuland, em 2014, directora assistente da operação americana, com um custo superior a 5 biliões de dólares, para estabelecer na Ucrânia, a "boa governação" (como ela própria declarou [1]). Não está excluído que nesta altura tenham um plano: promover uma ofensiva das forças de Kiev no Donbass, apoiadas de facto, pela NATO. Isto colocaria Moscovo perante uma escolha que, de qualquer modo, seria vantajosa para Washington: deixar que as populações russas do Donbass fossem massacradas, ou intervir militarmente em seu apoio. Brinca-se com o fogo, não em sentido figurado, acendendo a mecha de uma bomba no coração da Europa.

Tradução Maria Luísa de Vasconcellos   -  Fonte: Il Manifesto (Itália)

[1] “Remarks by Victoria Nuland at the U.S.-Ukraine Foundation Conference”, by Victoria Nuland, Voltaire Network, 13 December 2013.




domingo, 27 de fevereiro de 2022

Porque há Guerra na Ucrânia?

A cobardia dos que querem dominar o Mundo

Entrevista ao Major General Raul Cunha, antigo comandante de tropas NATO

A população ucraniana merece o nosso apoio e solidariedade, com tudo que possamos fazer para minorar o seu sofrimento e desgaste.  

Por falta de competência dos governantes europeus, estamos a assistir a uma guerra na Ucrânia, que causa graves sofrimentos para as populações da Europa e do mundo; além das perdas de vidas humanas e dos bens pessoais, todos os bens de consumo irão sofrer agravamento de custos.

Tal como referia um prestigiado coronel português, com prestações de serviço na NATO e organismos europeus, o fracasso das negociações preventivas da guerra deve-se à hipocrisia dos governantes, por falta de capacidade para entender o que estava em jogo e por sentirem que a NATO pode resolver tudo. "Os governos dos países europeus integrados na NATO comparam-se a uma matilha de cães amestrados que os falcões americanos, à distância, atiçam contra os povos ou governos que definam como inimigos."

O resultado dramático aí está: destruição de bens e refugiados aos milhares. Que os poderosos se entendam, para que haja paz!







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POR MELVIN GOODMAN

8 DE DEZEMBRO DE 2021

As sementes para a crise na Ucrânia foram plantadas 25 anos atrás, quando o governo Clinton decidiu expandir o Tratado do Atlântico Norte para o Leste Europeu, aceitando a adesão de ex-membros do Pacto de Varsóvia. Ao fazer isso, Clinton deu as costas aos compromissos do presidente George HW Bush e do secretário de Estado James Baker em 1990 de não "saltar" sobre uma Alemanha reunificada para expandir a OTAN. Bush e Baker assumiram esse compromisso em discussões privadas com o presidente soviético Mikhail Gorbachev e o ministro das Relações Exteriores, Eduard Shevardnadze, a fim de obter a remoção de 380.000 soldados soviéticos da Alemanha Oriental e de vários Estados da Europa Oriental. Sem esse compromisso, a reunificação da Alemanha não teria ficado isenta de tensões entre os Estados Unidos e a União Soviética.


Se os Estados Unidos pudessem encontrar uma maneira de reconhecer essa traição e conceder que a adesão adicional da Ucrânia e da Geórgia ameaçaria o universo geopolítico da Rússia, seria possível buscar um meio-termo para a crise atual. O presidente russo, Vladimir Putin, deseja razoavelmente garantias de que a Otan deve interromper sua expansão para o leste e não implantar certos sistemas de armas em suas fronteiras. Em troca, os Estados Unidos devem insistir no retorno ao acordo de Minsk II em 2015, que foi projetado para garantir um cessar-fogo bilateral, para criar zonas de segurança na fronteira entre a Ucrânia e a Rússia, e para descentralizar o poder político no leste da Ucrânia (o Donetsk e regiões de Luhansk). A Rússia seria obrigada a retirar todos os mercenários estrangeiros das regiões; (especialmente os de cariz nazi inscritos no Batalhão Azov, ao serviço do exército ucraniano).

Washington e Moscovo foram capazes de criar um processo para remover as armas nucleares da Ucrânia após a dissolução da União Soviética em 1991; eles devem ser capazes de chegar a um acordo que reconheça a soberania da Ucrânia, mas limite a presença militar ocidental nas fronteiras da Rússia. As negociações de controle de armas abriram as portas para a détente soviético-americana na década de 1980. Um acordo sobre a Ucrânia permitiria melhorar as relações bilaterais em áreas-chave entre os Estados Unidos e a Rússia.

Putin não está procurando ganho territorial ou um renascimento do império soviético na Europa Central e Oriental, mas a grande mídia está convencida de que Putin está preparando uma invasão militar russa à Ucrânia que desestabilizaria toda a Europa. Um editorial do Washington Post na semana passada apontou para as 90.000 tropas russas na fronteira com a Ucrânia, bem como a apreensão e anexação da Crimeia em 2014. O Post e outros jornais importantes se viram convencidos de que apenas a pressão política, económica e militar dos Estados Unidos permitirá uma solução diplomática para a crise.



Mais importante, a mídia deixa de mencionar a responsabilidade dos EUA pela atual tempestade, que pode ser atribuída às administrações de Bill Clinton e George W. Bush que imprudentemente expandiram a OTAN, trazendo aos vizinhos imediatos da Rússia e até mesmo ex-repúblicas soviéticas uma aliança de agora 30 membros. A expansão da OTAN é o principal irritante nas relações russo-americanas e a principal causa do que parece ser o início de uma nova Guerra Fria. A disposição de Gorbachev em aceitar a reunificação alemã sem garantias de segurança explica a difamação russa de Gorbachev e do ministro das Relações Exteriores, Shevardnadze, até hoje. A exploração por atacado da fraqueza russa pelos EUA na década de 1990 explica a insistência inflexível de Putin em interromper o avanço do Ocidente.

Os Estados Unidos tomaram medidas adicionais gratuitas às portas da Rússia nas últimas duas décadas. Os governos de Bush e Obama implantaram um sistema avançado de mísseis terra-ar na Polônia e na Romênia, argumentando que era necessário para conter um possível ataque de mísseis iranianos na Europa Oriental. Quanta besteira! As marinhas dos EUA e da Grã-Bretanha continuam a posicionar navios de combate no Mar Negro que ameaçam entrar nas águas territoriais russas. Vários membros da OTAN na Europa Oriental e no Báltico estão solicitando sistemas militares ocidentais adicionais, bem como uma presença militar permanente dos EUA. A presença de forças militares alemãs no Báltico é uma afronta especial às legítimas preocupações da Rússia sobre sua segurança e soberania.

O presidente Joe Biden não parece mais sábio do que seus quatro predecessores. Ele se reuniu com o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky em setembro, e eles assinaram uma “Declaração Conjunta sobre a Parceria Estratégica EUA-Ucrânia”. Ele enviou o secretário de Defesa Lloyd Austin a Kiev em outubro para enfatizar a importância da "parceria estratégica". As referências de Austin a um “melhor caso” que significa “não veremos uma incursão da União Soviética na Ucrânia” é o tipo de deslize freudiano que revela o pensamento da Guerra Fria da equipe de segurança nacional de Biden.

Atualmente, uma equipe da Força Aérea dos EUA está em Kiev para avaliar os requisitos de defesa aérea da Ucrânia e, na semana passada, bombardeiros com capacidade nuclear dos EUA sobrevoavam o Mar Negro, representando uma ameaça à Rússia. Não é preciso muita imaginação para antecipar a reação dos EUA às aeronaves estratégicas e aos navios de guerra russos que operassem no Golfo do México ou no Caribe.